... de composição poética, com 14 versos. A poesia, de forma geral, embeleza a vida e somente em regimes autoritários foi algumas vezes considerada nociva, do latim nocivu, declinação de nocivus, que prejudica.
Descamisado: de camisa, do latim
camisia, roupa de dormir ou ficar na cama, mas que mudou de significado no português do Brasil, vindo a designar peça do vestuário masculino, usada sobre a camiseta, pequena camisa, ou diretamente sobre a pele, e que vai do pescoço às coxas. Acrescida do prefixo "des", indicando negação, a palavra designa o maltrapilho, aquele que se veste mal por lhe faltar tudo, inclusive a roupa. Os revolucionários espanhóis de 1820 receberam o epíteto de descamisados, dado pelos inimigos, naturalmente, para deboche. Em 1945, na Argentina, o vocábulo, escrito em espanhol exatamente como em português, passou a designar os seguidores do general
Juan Domingo Perón (1895-1974). A palavra "descamisados" aparece neste texto do historiador gaúcho
Voltaire Schilling (64), comentando os funerais de
Evita Perón (1919-1952), esposa daquele ditador: "
Para o povo do Prata foi como se tivessem perdido sua maior protetora, a mãe dos pobres, dos descamisados, enquanto que para os seus inimigos e do regime foi um alívio e um prenúncio do fim da ditadura."
Nocivo: do latim
nocivu, declinação de nocivus, nocivo, que prejudica. No latim, o verbo é
nocere, causar dano, radicado no indo-europeu
nok-eyo, acusativo de
nok, matar. O inglês
neck, pescoço, aparece em expressões idiomáticas que remetem o étimo a prejudicar, submeter-se, arriscar-se, como em "
to risk one's neck", arriscar o pescoço, que no português mudou para "arriscar a própria pele".
Ivan Lins (63), porém, usou "até o pescoço", não para designar afogamento ou complicação, mas esperança, na letra de
Cartomante, gravada por
Elis Regina (1945-1982): "
Nos dias de hoje não lhes dê motivo,/ Porque na verdade eu te quero vivo,/ Tenha paciência, Deus está contigo/ Deus está conosco até o pescoço".
Soneto: do provençal
sonet, versos com melodia, algumas vezes acompanhados de música, pelo italiano
sonetto, soneto, sonzinho. Esta forma de poesia, composta de 14 versos hendecassílabos (de 11 sílabas), é estrututrado do seguinte modo: os oito primeiros versos formam duas quadras e os outros, dois tercetos. O poeta catarinense
Solange Rech (1946-2008) recolheu o primeiro soneto impresso, originalmente escrito em italiano, de autoria atribuída a
Pier delle Vigne (cerca de 1190-1249), que diz, nos primeiros versos: "
Però ch'amore non si pò vedere/ e no si tratta corporalemente", "
ch'amore si face sentire dentro dal cor signoreggiare la gente" (o amor não se pode ver, e não se trata corporalmente, o amor se faz sentir dentro do coração a governar as pessoas). Quem inspirou estes versos foi um amor proibido, uma dama da corte de
Frederico II (1194-1250), chamada
Florismunda. Denunciado por "arrebatamento impulsivo", Delle Vigne perdeu o emprego no palácio e se matou.
Dante Alighieri (1265-1321), na
Comédia, conhecida como
Divina Comédia após as aulas de
Giovanni Boccaccio (1313-1375), que se referia à obra como "divina", pôs o poeta no sétimo círculo do inferno, que destinou aos suicidas.
Tranchã: do francês
tranchant, cortante e, em sentido figurado, decisivo. A origem remota é o verbo
trancher, escrito
trenchier no francês do século XII. Provavelmente foi alteração do latim
truncare, truncar, amputar, mutilar, verbo formado a partir de
troncus, tronco, levado à Gália, como então se chamava a França quando
Júlio César (100-44 a.C.) lá chegou com as guerras gaulesas. Quem resolvia logo um problema, semelhava o desbravador que cortava galhos. Séculos depois surgiria daí a expressão "quebrar o galho". As metáforas da vida rural estão repletas de figuras de linguagem com recursos semelhantes. O italiano acolheu
tranchant sem modificar-lhe a grafia, definindo-o como um juízo ou frase que faz críticas duras, sem admitir possibilidade de réplica. O poeta popular
Vandim das Espinharas, da Paraíba, usou a palavra com outro sentido para qualificar o resultado das obras de recuperação do Solar José Rufino, na Comarca de Areia, na Paraíba, prédio remanescente do século XIX. Ele improvisou décimas de cordel clássico, em redondilha maior: "
Do Tribunal, do Iphan,/ que trabaiáro em parêia/ co'a Prefeitura de Areia,/ tornei-me agora mais fã!/ Pois não é que num tranchã/ recuperáro o Sobrado,/ o Solar do Zé Rufino?!/. E o Casarão reformado/ conservou o seu traçado/ original, genuíno!.../ Estava o prédio caíno...". Ele quis dizer que o Tribunal de Justiça, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e a Prefeitura de Areia trabalham unidos, recuperando o sobrado, que estava caindo.