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Michael Kors, impossível resistir

Ícone da moda, o estilista americano comemora anos de sua marca e abre sua primeira loja em Paris. A seguir, ele fala das suas conquistas, sonhos incluindo o sofá que nunca terá e explica por que ser chique é ter senso de humor e autenticidade.

Redação Publicado em 10/10/2011, às 14h00 - Atualizado em 08/08/2019, às 15h43

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Michael Kors - Getty Images
Michael Kors - Getty Images

Ele é o homem mais incontrolável nesse negócio. E depois de 30 anos, apenas esse feito já seria uma realização. Mas, além disso, Michael Kors ama moda e estilo tanto quanto anos atrás, quando era um aluno brilhante no Fashion Institute of Technology (FIT) e a visão de Calvin Klein na exclusiva boate Studio 54 o fez sonhar com “meu próprio sofá ali um dia”(objetivo que nunca foi alcançado). Ou ainda antes disso, quando o desejo por um relógio Cartier Tank fez o então garoto de 16 anos economizar seriamente (missão já cumprida). Hoje, o que acelera o coração de Kors é ver uma mulher usando suas criações. “Eu adoro as modelos, mas realmente amo olhar as roupas nas normais”, como ele se refere a suas fiéis clientes quando não as chama de “donas da verdade”.

Kors também é teimoso, de uma maneira que oscila sempre para o lado mais ensolarado de uma proposta. Tanto é assim que, nesse mercado altamente
competitivo e difícil, ele inspira uma genuína e quase universal afeição. Mas como não se pode ter uma quedinha por um cara que, enquanto caminha
por sua nova e deslumbrante loja de 650 m2 na Rue Saint-Honoré, em Paris, se gaba de ter também uma loja em Staten Island, em Nova York?

Esta entrevista com Kors aconteceu às vésperas do divino jantar oferecido em comemoração aos 30 anos de sua marca na residência oficial de Charles
Rivkin
, embaixador americano na França. A recepção aconteceu em enormes e douradas salas sob o olhar atento de um gigante e jovem George Washington e, na ocasião, o coquetel de camarão foi servido acompanhado por molho importado de Manhattan.

CARAS FASHION - A loja é muito bonita. Tão chique e, ao mesmo tempo, aconchegante.

MICHAEL KORS
- Por que as pessoas acham que ser chique significa não ter senso de humor? Acho isso a coisa mais estranha. E isso também acontece com espaços. Quando você entra em uma loja de varejo ou é tudo tão enfeitado que você mal consegue ver o produto ou é como se fosse um templo Zen, sem humor e sem conforto. Aqui, as pessoas vêm para passear e se divertir. No fi nal das contas, se eu acredito que as melhores roupas são
a moldura de uma mulher, a melhor loja também é a moldura para as roupas.

CARAS FASHION - Já faz algum tempo que você deixou a maison Céline. Você sente saudades de trabalhar em Paris?

MICHAEL KORS
- Não sinto falta de fazer dois desfiles. Mas se eu sinto falta de ficar mais tempo em Paris? Eu amo ficar aqui. A cidade, verdadeiramente, é a encruzilhada da moda. Moda ainda é o esporte nacional da França. Em Nova York, durante a semana de moda, você nunca vai ouvir um taxista dizer, “Oh, o desfile do Michael Kors acabou de terminar. Eles estão todos indo para o da Proenza Schouler”. Em Paris, todos sabem de tudo. Você pode entrar numa apresentação e um garçom dirá “O aniversário de Sonia Rykiel foi fabuloso”. Isso é parte da vida aqui. Então, claro, como designer, eu sinto falta de estar em um lugar onde as pessoas amam a moda tanto assim e não estão chocadas ou deprimidas por causa dela. Mas fazer dois desfiles por estação, disso eu não sinto saudades não.

CARAS FASHION - Você está celebrando o 30° aniversário da Michael Kors com um jantar na residência do embaixador Rivkin, aqui em Paris, e em Nova York você preferiu uma festa no luxuoso hotel The Carlyle. Você é tão bom sendo você mesmo. Você não quer ser o mais normal de todos.

MICHAEL KORS  - Eu acredito que a melhor coisa de estar aqui por mais de um nanosegundo é realmente se conhecer, saber o que te diferencia como pessoa, como designer. Eu sempre brinco, quando comecei a fazer desfiles de moda nos anos 1980, que todos nós colocávamos nossos nomes na parede do fundo.

CARAS FASHION  - Esse era o marketing.

MICHAEL KORS - Esse era o marketing e, agora, muito poucas pessoas fazem isso.

CARAS FASHION - Tudo a ver com autenticidade.

MICHAEL KORS - Se você é autêntico, as pessoas confiam em você. Você tem de ser autêntico, mas ao mesmo tempo surpreender, dar-lhes um chacoalhão. E, você sabe, as consumidoras também nos sacodem. Minha cliente não é alguém que normalmente ama longos, mas nessa Primavera, elas compraram. Então, você tem sempre que, dentro do limite, ser autêntico, tentar coisas novas.

CARAS FASHION- Você já viu muita coisa nesses 30 anos. Quais são as maiores mudanças e o que continua igual?

MICHAEL KORS - Primeiro, quando eu comecei, o que nós pensávamos que fosse global era vender em uma loja de departamento em Londres e, talvez, ter uma licença japonesa. E o que nós acreditávamos ser variação era desenhar roupas para uma cidade americana específica. Como por exemplo, as mulheres de Chicago adoram cinza e em Dallas precisamos de muitas cores! Havia todos esses detalhes, mesmo dentro da América, de como a mulher se vestia e o que era adequado. E também o que era apropriado para cada idade. “Isso é para os clientes de vinte e poucos anos”, e “ninguém com mais de 35 anos vai usar roupa sem manga”. Até mesmo para os tecidos as regras eram bem severas. Todos eram mais ou menos assim, “você não pode ter lã na Primavera. Nem pensar. Sandálias? No Outono? Você está louco?”. E roupa de dia para a noite e roupa de noite para o dia? Não existia. O primeiro look do meu primeiro desfile para a Women’s Wear Daily era “Dia para Noite”. E era uma calça cinza de flanela com um roupão dourado metálico e um robe de cashmere preto por cima.

CARAS FASHION - Em que ano foi isso?

MICHAEL KORS  - Provavelmente em 1984. Naquele tempo, você deveria dizer aos seus clientes, “Você pode usar isso durante o dia e aquilo à noite”. E eles diriam, “Você pode usar alguma coisa metalizada durante o dia?”. Agora eu brinco que existem mulheres que usam vestidos de festa para trabalhar. Tenho clientes de 70 anos que usam roupas decotadas. E a democratização é tão diferente. Antigamente, se você tinha bom gosto, era rico. Ou você era estudante. Hoje, temos clientes com vinte anos que já estão começando a trabalhar e já têm ótima visão e bom gosto. E nós fazemos para elas produtos
que são sofi sticados e acessíveis. As regras diminuíram. Essa coisa da idade com certeza mudou. Acho que a palavra “apropriado” caiu por terra. O significado de “ser apropriado” é muito pessoal.

CARAS FASHION - Muitas mudanças.

MICHAEL KORS  - Tudo isso mudou tremendamente. Além disso, quando você vê alguma coisa que é sucesso, ela é sucesso em Nova Orleans, em Paris, em Nova York, em Toronto, no Canadá, e também na Ásia. Não importa onde. Todo mundo tem acesso à informação. Eu brinco que é como se a internet tivesse se transformado no tom-tom (um tambor usado pelos índios americanos) fashion. Ela envia sinais de fumaça que dizem: saia plissada, Michael Kors, longos, vista isso, você tem que ter aquilo. E, de alguma forma, todas as mulheres sabem. E o que não mudou, bem, acho que as mulheres estão mais paranoicas do que nunca com seus corpos e o envelhecimento. Então, o que continua igual... Não importa o quanto alguma coisa é divina, ela veste, se olha no espelho e acha que fi cou maior, menor ou mais velha. Isso não mudou nada.

CARAS FASHION - Como a abertura dos mercados emergentes impactou os seus planos? 

MICHAEL KORS  - Para qualquer um no mercado da moda, nada é mais sensacional do que gente que é apaixonada por moda. Por exemplo, eu era um adolescente louco por moda e, muitas vezes, você acha que isso só faz parte da juventude. Mas, na verdade, é característica da novidade. Você fi ca animado por alguma coisa. E nos mercados emergentes, você tem a curiosidade e um nível de excitação que você talvez não tenha em um mercado já estabelecido. Honestamente, no mundo atual, os níveis de bom gosto e sofi sticação se aceleram muito rápido e, de repente, você pode dizer, “Espera um minuto. Dez anos atrás, ela usava roupas sem graça, sem nenhum sex appeal, sem glamour e, subitamente, ela sabe tudo isso”. Ou faça o caminho contrário. Você pode olhar para a Rússia e dizer, “Há 15 anos, os consumidores russos só queriam produtos glamourosos e top de linha”. Hoje, nós vendemos para eles muitas roupas descontraídas e esportivas.

CARAS FASHION - Sua primeira experiência como designer foi na butique nova-iorquina Lothar's, enquanto você estava no FIT. Quais eram as suas expectativas para a sua carreira naquele tempo?

MICHAEL KORS  - Olha só, eu sou competitivo e, definitivamente, sou obstinado. Então, não entro em jogo nenhum a menos que eu saiba que posso ganhar. Quando decido alguma coisa, vou até o fim. Por isso, certamente, eu pensava numa carreira longa na moda. Mas se algum dia eu pensei que estaria aqui, abrindo uma loja, uma loja Michael Kors, em Paris? Sinceramente, quando eu comecei – estou tentando lembrar –, qual designer tinha suas próprias lojas naquela época ? 

CARAS FASHION - Com certeza, Saint Laurent.

MICHAEL KORS - Saint Laurent e Courrèges, sim. Eles tinham as duas únicas lojas de designers independentes. Mas, certamente, como um designer americano, era mais ou menos, “Bem, talvez eu tenha um canto em uma loja de departamento e isso será ótimo”. Além disso, nunca pensei que eu fosse estar entre os mais consagrados, porque sou muito casual. Meu conceito de reunião de projeto é jogar uma caixa de pizza no chão, chamar todo mundo para sentar em volta e dar uma olhada em algumas amostras de tecidos e outros materiais. Sabe, quando alguém me chama de Senhor Kors, eu viro e respondo, “Meu pai não está aqui”. E, atualmente, eu acredito que qualquer um é icônico. Vejo isso em Hollywood também, está em todo lugar. Quando eu penso em icônico, penso em Kirk Douglas, isso é icônico. Então, quando eu leio alguma coisa que diga, “designer americano icônico...”

CARAS FASHION - Mas hoje você é.

MICHAEL KORS - Eu ainda penso que sou uma criança. Ainda uso chinelo de dedo. E eu ainda acho que a coisa mais emocionante quando você continua em frente é não encontrar apenas novos lugares para fazer negócios. Eu amo quando encontro novas mulheres e novas idades, novos tipos... Porque isso me surpreende e eu adoro surpresas.

CARAS FASHION- No começo, você tinha alguma ideia de quão difícil seria esse negócio? 

MICHAEL KORS - O que é engraçado, o que é chocante agora, eu aprendi muito fazendo o Project Runway, porque hoje eu realmente sento e assisto a um desfile.

CARAS FASHION  - Você tem algum conselho?

MICHAEL KORS  - Esteja pronto para ter um desfile. Tem mais a ver com isso do que apenas apresentar um bom show. Você pode, de fato, produzir as roupas? Elas servem? Você pode entregar no prazo? Elas têm preços apropriados? E, também, você está respondendo a uma pergunta que nunca foi respondida? Porque se você não estiver respondendo a uma pergunta que ainda não foi respondida, você será apenas mais um. Um pontinho na tela.

CARAS FASHION - A qual pergunta você respondeu? Você ainda tenta responder?

MICHAEL KORS  - Bem lá no início, eu estava convencido de que era possível ser sexy e esportivo ao mesmo tempo. Depois, tudo o que era esportivo era muito esportivo, muito casual e tudo o que era sexy era bombástico. Sempre fui muito intrigado com essa moleca sexy. Essa era a minha essência. E aconteça o que acontecer, esse sempre será o meu “ethos”.

CARAS FASHION - Falando do papel da celebridade, tanto do estilista como celebridade quanto da corrida por vestir famosos, como isso mudou a moda e se foi para melhor?

MICHAEL KORS - Eu cresci achando que designers eram celebridades porque, para mim, eles eram. Fui ao desfile do estilista de roupas masculinas Perry Ellis na Bloomingdale's quando eu tinha 17 anos. Lembro-me de ver Calvin Klein no Studio 54, e o também designer Halston (Roy Halston Frowick). Era isso que eu queria: meu lugar no Studio 54, assim como Calvin.

CARAS FASHION - Seu coração parava.

MICHAEL KORS - Ontem à noite nós jantamos no restaurante Caviar Kaspia e eu me lembro que, nem faz muito tempo assim, eu vi Saint Laurent entrando com o seu cachorro ali para almoçar e eu não podia respirar. Eu estava tipo, “ai meu Deus, Saint Laurent está almoçando!”. Mas eu acho que celebridades fashion eram só para os fashionistas. Eu era um fashionista. Agora, eu acredito que os designers entraram de vez no mundo da cultura pop e não apenas por causa da televisão e programas como o Project Runway. Acho que a internet, com certeza, fez isso. Com a moda mais democratizada, as pessoas sentem que existe alguma coisa lá para elas e, então, talvez, fi quem curiosas.

CARAS FASHION - Você teve altos e baixos durante todos esses anos e parece não ter desanimado nunca.

MICHAEL KORS - Nos anos 1990, quando nós pedimos concordata, eu estava lá há mais de uma década, o que eu pensava que realmente fosse tempo demais. E hoje vejo que era apenas um novato, um iniciante. Mas, naquele tempo, eu me perguntava se eu deixaria de ser eu mesmo se algo acontecesse. “Ai, meu Deus, eu trabalhei tanto, me matei, e se isso não funcionar e nós não formos capazes de sair dessa situação, será que eu terei alguma identidade como pessoa?”. Será que toda a minha identidade está amarrada em ser Michael Kors? Finalmente, percebi que se eu tivesse de voltar à estaca zero, se eu fosse honesto e autêntico iria funcionar. É isso que funciona. Você tem de se conhecer. Até porque, o que você conhece? Se você acha que fez alguma coisa, você está acabado. A pergunta que eu mais odeio é: “quando você soube que conseguiu alguma coisa?”. Se você pensar “eu cheguei, eu estou no trono”. Adivinha? Aquelas pessoas que carregam o trono vão derrubá-lo.

CARAS FASHION - Acabado? Não você. Sua clientela continua crescendo.

MICHAEL KORS - Essa é a melhor coisa. Mary J. Blige cantando no jantar. É uma aposta tripla e é muito Michael Kors, porque é uma combinação um pouco estranha, eclética. Na celebração dos 30 anos, Bette Midler cantou para mim no backstage depois do meu desfile, Judy Collins cantou para mim naquela noite, Mary J. cantou para mim em Paris. E você diz, “Espera um minuto, o que essas três mulheres têm em comum?”. Sobreviventes.