CARAS Brasil
Busca
Facebook CARAS BrasilTwitter CARAS BrasilInstagram CARAS BrasilYoutube CARAS BrasilTiktok CARAS BrasilSpotify CARAS Brasil

Se um relacionamento não é nada fácil, imagine-se com dois amores

Paulo Sternick Publicado em 14/06/2006, às 21h41

WhatsAppFacebookTwitterFlipboardGmail
Paulo Sternick
Paulo Sternick
Ficar envolvido afetivamente com duas pessoas ao mesmo tempo deixou de ser "licença" concedida a imaturos adolescentes. Nos conturbados e instáveis dias de hoje, cada vez mais adultos se vêem enredados na mesma situação. É que o grau de permissividade dos costumes está aumentando. A vigência das uniões há muito mudou do tradicional "até que a morte os separe" para o poético "que seja eterno enquanto dure". Há, ainda, maior tolerância para amores múltiplos, simultâneos, muitos dos quais passageiros, no espírito de uma época que reconhece a complexidade do ser humano e cultua o individualismo, a liberdade e a liquidez dos vínculos. Isso acaba favorecendo a ocorrência do dilema de estar "amando" duas pessoas ao mesmo tempo, num enredo confuso e, não raro, sofrido em seus prolongados impasses. A situação pode acontecer, por exemplo, quando se dá início a uma nova relação enquanto outra, mais antiga, ainda persiste, apesar de estar em crise. Nesses casos, sentimentos contraditórios de amor e culpa oscilam entre ambas as relações, muitas vezes obrigando o pombinho indeciso a verdadeiros malabarismos. Não é aconselhável que se comece um novo relacionamento enquanto o anterior não acabou. Mas nem sempre o que é ideal se aplica à realidade. Muitas pessoas não têm coragem de ficar sozinhas, juntando seus "cacos", suportando a dor da separação, ou mesmo da iminência dela e, até antes do término, acabam se envolvendo num novo amor, na esperança de que ele as salve do sofrimento. Real ou aparente, a diluição do romance antigo deixa os parceiros tão desolados e entristecidos que o coração - carente e solitário - pode exigir esse substituto amoroso salvador. Afinal, em nossa cultura voltada ao prazer há a suposição de que existe remédio para tudo. Porém, chega a ser "covardia" comparar uma relação de algum tempo - com suas imperfeições, seus altos e baixos e o inevitável desgaste cotidiano - com um novo namoro em que o estar a dois é celebrado quase que permanentemente como um momento de prazer e entusiasmo. Não é o caso de condenar o desejo de mudança e a ânsia por melhores convivências. Como tudo na vida, o amor é passível de ter início, meio e fim. Mas precisamos ficar atentos para identificar ingênuas armadilhas que acenam com felicidade completa e prazeres ilimitados. Em geral, são promessas ilusórias. Quem se envolve com uma pessoa antes de se separar de outra raramente se livra de constatar que o preço da situação é alto demais, que a satisfação obtida exige muito sacrifício. O mesmo vale para quem se envolve com dois amores simplesmente por não ter nenhum. Ou para aqueles que não conseguem mesmo ficar com um só parceiro, uma vez que isso exigiria, claro, responsabilidades e renúncias. Nesse último caso, a manutenção de dois relacionamentos obedece à curiosa lógica de fazer com que cada um deles livre o indeciso de assumir o compromisso com o outro. O fato é que é preciso estar "casado" consigo próprio para poder construir uma relação estável com outra pessoa. Só quando nos sentimos confusos, partidos, ainda na procura de quem somos e do que queremos, é que dividimos nosso desejo. Estar "casado consigo próprio" significa entender o próprio desejo, tolerando suas contradições. É estar inteiro - íntegro - no desejo por uma pessoa, não obstante as ambivalências, poupando o nosso amor do sofrimento e da desilusão que seriam inevitáveis caso deixássemos de lhe ser leal. É também não acalentar sonhos e desejos impossíveis de realizar - inclusive o de encontrar uma relação perfeita. O amor, vale destacar, finalmente. tem parentesco com a modéstia, não combina com a avidez, a arrogância e o desejo de satisfações ilimitadas.