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O desejo não pode ser onipotente. Deve respeitar o desejo do outro

Redação Publicado em 02/08/2011, às 16h29 - Atualizado em 08/08/2019, às 15h43

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Em maio último, o mundo se espantou com o episódio que envolveu o francês Dominique Strauss-Kahn (62), um dos homens mais influentes das finanças mundiais, até então presidente do Fundo Monetário Internacional (FMI). Líder nas pesquisas para as eleições presidenciais de 2012 na França, ele foi preso em Nova York, nos Estados Unidos, envolvido numa trama que pode ter sido armada por uma camareira do luxuoso hotel onde se hospedava. Entre as charges que ironizaram a prisão, uma colocou na fila para visitá-lo na cadeia personagens mundiais também envolvidos em escândalos sexuais, como o ex-presidente norte-americano Bill Clinton (64) e o governador da Califórnia, Arnold Schwarzenegger (63). Com eles, na fila, poderia estar, de forma simbólica, uma “virtualidade humana” universal: a crença infantil no desejo onipotente, aquele que deve ser atendido de qualquer maneira, às expensas das condições de satisfação.

Acontece que Strauss-Kahn não é uma criança, e a camareira não estava lá na função de babá a dar-lhe de mamar. Tinha outros desígnios. A julgar por outra acusação de estupro, de uma jornalista francesa, o ex- dirigente do FMI está mais enrolado do que as economias emergentes que sua instituição dizia ajudar no passado. Mas o ponto que nos interessa no acontecimento — e que serve de lição a todos que poderiam estar naquela fila que se identifica com sua atitude — é que a falta de noção e a crença sem critério no canto da sereia podem ser castigadas, duramente castigadas, prejudicando carreiras, vidas e relações. A começar pelas vidas: da vítima, se for desrespeitada, e do réu, que, como se diz dos peixes, “morre pela boca”, estragando seu futuro por alguns segundos de impulso e prazer.

O fato de desejar ardorosamente alguém — seja por amor, seja pelo sexo casual — não é critério para concluir que esse alguém possa querer o mesmo, ou esteja bem-intencionado. E nosso desejo tem um limite intransponível no desejo do outro, ainda que se possa tentar de forma criteriosa todos os expedientes da sedução. Isso vale até para casais que moram juntos, namorados, “rolos”, casos: há momentos em que ele ou ela não estão dispostos, e a última coisa que poderiam desejar é manter intimidade sexual, sendo uma violência tentar forçar a barra apenas para satisfazer o próprio desejo.

Essa diferença é o que distingue os civilizados dos “selvagens”, ainda que uma dose canalizada e benigna de “selvageria” seja inerente ao exercício do desejo. Mas há uma frágil linha que separa a insistência voluptuosa da violência que avança o sinal da ética, e convém que estejamos atentos a esta diferença. Mesmo nos momentos de ardor, a razão e a ética devem continuar emitindo seus sinais:afinal, não somos bichos!

Tal cuidado pode sofrer uma pane em pessoas que têm compulsão sexual e não suportam o adiamento. Estas deverão daqui para a frente se lembrar de Strauss-Kahn e se prevenir sobre os riscos que correm. Curioso é que a revista alemã Der Spiegel fez há pouco um artigo em que tenta desautorizar o conceito de vício sexual, atribuindo sua invenção a uma espécie de complô de conservadores, laboratórios médicos e religiosos para reprimir a sexualidade. Realmente, o limite é difícil de ser traçado. Hoje, porém, em certas situações do amor e do desejo, ser displicente em questões de postura pode acarretar amargos efeitos.