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Na crise, viajar é preciso. Mas só turismo não salva a relação

Paulo Sternick Publicado em 30/08/2006, às 15h37

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Todo mundo faz mil fantasias sobre a "lua-de-mel". Mas a romântica expressão, consagrada há milhares de anos, tem origem polêmica e significações múltiplas, que - pasmem! - incluem até insinuações irônicas. Pois, como a Lua, o amor tem suas fases - minguante, crescente, de mel ou de fel. A lua-de-mel seria uma fase maravilhosa, porém uma fase. De fato, quase todo casal sabe que, se a lua-de-mel é passageira, a lua-de-fel pode estar à espreita. Na órbita do amor, o caminho é de mão dupla. Do mesmo jeito que os pombinhos tropeçam num amargo estresse, podem voltar a se aninhar num doce amor. Mas a repetição dos maus momentos desgasta o relacionamento a ponto de correr o risco de chegar a um limite. É nesse instante que surge a idéia salvadora: "Vamos viajar?". Isso não é apenas uma fórmula mágica, porque a iniciativa pode ser boa. O filósofo e escritor francês Blaise Pascal (1613-1662) teria sido, porém, muito radical ao dizer que "a causa única da infelicidade do homem está no fato de não saber ficar tranqüilo em seu próprio quarto". Toda viagem carrega um ar de renovação, pois serve para conhecer lugares novos, interrompendo a rotina do trabalho e/ou do estudo e as obrigações diárias, que incluem a relação com os filhos, trânsito intenso e desgastante, empregada, supermercado, chefe, sogra e a cidade perigosa. Os problemas do cotidiano interferem no amor do casal numa medida que nem sempre os parceiros se dão conta. Os que ainda não estão casados podem, numa viagem, ter a liberdade de ficar maistempo juntos. Há um estado de espírito propício para namorar, conhecer-se melhor, vivenciar um trailer da vida a dois. Viajar é desligar os botões das amarras cotidianas e mergulhar no desconhecido, não apenas de paisagens, pessoas e culturas diferentes, mas também das experiências mútuas. Um casal que reúne mais elementos construtivos e amorosos recupera o ânimo numa viagem, reabastecendo-se de esperança. Há mais distanciamento para delimitar e compreender o que desgastava a união. A verdade é que não existe "relação estável". O que há são relações que perduram, suportando ao longo do tempo as suas inevitáveis turbulências. Para tal, é necessário, primeiro, ter clareza de que se deseja manter o outro junto a si. Depois, especial sabedoria, que, certamente, não dispensa renúncias e tolerâncias,surpresas e quebras de rotina. Entre elas, as viagens - prolongadas ou curtas, para longe ou perto - chamam de novo os parceiros para a emoção singular de seu encontro. Mas, verdade seja dita, trata-se de uma faca de dois gumes. Se viajar pode arejar a relação, também contém perigos: caso ela esteja "condenada", isso ficará mais transparente. O casal, incapaz de superar seus impasses e aproveitar os bons momentos, sente que o tiro saiu pela culatra. Em vez de descontrair e aproximar, liberando a afeição e o desejo, a viagem expõe todas as divergências, rusgas e incompatibilidades. A decepção recíproca aumenta com o fracasso da tentativa. Inversamente, outra armadilha a ser pensada é o perigo, mesmo que a viagem tenha sido boa, de tudo não passar de efêmeras férias turísticas. Na volta, o casal, ou um dos parceiros, retorna aos impasses, porque não houve modificação pela experiência. Logo que chegam, os atritos recomeçam, como se um feitiço fosse desfeito. Houve apenas férias superficiais dos desamores, em prol de uma viagem não menos superficial, só por novas paisagens e compras. Existe uma diferença entre o turista e o viajante. Neste último, a viagem é uma "viagem" mesmo. Provoca um intervalo de reflexão, constitui-se num percurso do próprio "eu" também para dentro de si, um repensar profundo de sua existência e de suas relações. É isso que traz mais verdade ao casal - para o sim ou para o não.