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Bens materiais são insuficientes para alimentar a vida amorosa

Paulo Sternick Publicado em 16/02/2006, às 10h26

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Paulo Sternick
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O carnaval está próximo e, mais um pouco, as águas de março de novo vêm fechar o verão, trazendo promessa de vida aos corações de todos os pombinhos que se conheceram nas férias e também àqueles que, juntos há mais tempo, sobreviveram aos agitos da época. Sim, digo sobreviveram porque, afinal, muitas expectativas são criadas nos meses de férias, em que se costuma viajar, fazer programas diferentes, sentir-se participante dessa festa coletiva de fantasia e prazer. Nem sempre, porém, as expectativas podem se realizar. Pois é comum haver mais ilusão do que realidade em tudo que se deseja. Afinal, existe também um empecilho concreto: as condições materiais para atender de imediato a tudo o que ambicionamos. Às vezes precisamos adiar gastos, seja por crises passageiras e dívidas, seja porque valorizamos projetos de longo prazo. Também nem sempre os parceiros estão de acordo sobre esse ponto. Mas, antes que mergulhem numa confusão, é preciso ter em conta que a vida é uma delicada negociação entre o presente e o futuro. Ou seja, quase sempre os recursos são limitados diante de desejos ilimitados. Portanto, às vezes é necessário renunciar a prazeres imediatos para garantir os dias que virão. O contrário também é verdadeiro: devemos ser capazes de renunciar a garantias futuras em nome de um desfrute do presente, caso contrário a vida perde a graça e vira um burocrático e cinzento mar de renúncias - e de lágrimas. Têm sorte os casais que podem conversar sobre tais questões e chegar a um acordo, mantendo princípios comuns. É verdade que às vezes há conflitos, a exigir um exame sincero das angústias que os perseguem. Uma das assombrações mais desgastantes é comparar-se com outros casais, ou seja, a inveja do que eles desfrutam na vida com os recursos de que dispõem - seja em dinheiro, seja em ousadia. Não é preciso ser economista ou ler o poeta e ensaísta americano Ralph Waldo Emerson (1803-1882) para saber que, quando os recursos aumentam, as necessidades crescem mais depressa ainda; o desejo é um gigante crescente que manto nenhum é capaz de cobrir. Quantas vezes os casais não ficam empanturrados de comida, ou saciados de sexo, e ainda assim se sentem vazios? O pior é que, não raro, decidem preencher o vazio com mais coisas materiais: compras, viagens, sexo, como se fosse isso que estivesse faltando. Tratado como um buraco a ser preenchido por coisas concretas, o vazio sempre retorna. Junto, é claro, com dívidas, insatisfações e brigas. Ora, há carências da alma que só podem ser minoradas e evoluídas - note que não disse eliminadas! - com alimento próprio. E alimento de alma não é material. Ela só se satisfaz com experiências singulares: afeição, gratidão, atitudes éticas e justas, criatividade, pensamento, espiritualidade, arte, sabedoria. Quanto custa um filme instigante ou um livro estimulante? Uma conversa a dois em um passeio a pé? Estar de bem com a vida não depende de nossa classe social. A alegria e o bom humor brotam de cada um, independente do quanto gasta ou consome. A bonança econômica ajuda e sempre é melhor do que o aperto. Mas costuma-se atribuir ao dinheiro a responsabilidade de trazer felicidade, algo de que é incapaz, isoladamente. O casal que está bem se diverte com ou sem dinheiro. E, se tiver para gastar, melhor que o faça com sabedoria, sem iludir-se com as seduções da cultura atual, que impõe aos mais ingênuos seus símbolos de sucesso, poder e felicidade. A lucidez também ajuda a defender-se da inveja que casais amigos talvez provoquem ao relatarem suas proezas - viagens espetaculares, o carro fantástico ou a linda televisão de plasma que compraram. Lembrem-se do alimento da alma. A relação amorosa não passa sem ele.